quarta-feira, 30 de dezembro de 2009

Mané Bigodinho

Chegou à portaria, seu posto de trabalho, se arrastando, pois tinha acabado de vir do descanso de meio-dia; a barriga quase não cabia nas calças, os botões da camisa azul, desgastada, seguravam bravamente a protuberância rígida e avantajada do abdome. “Sono de meio-dia vale dinheiro”, disse, sorumbático. O vendedor de pão passou à rua, empurrando o carrinho de mão carregado de “cacetinho”. “Quero pão!”, gritou Mané, comprou dois sacos cheios, voltou comendo um: “depois eu bato uma coca”, murmurou. Baixinho, troncudo com braços fortes, vestígios de um tempo em que malhava, sem pescoço, as pernas curtas, 1,56 de altura, não era o biótipo de um homem gordo, apenas a barriga denunciava o gosto por: “escaldado de rabada, escaldado de siri, mocotó preparado com carne de sertão,calabresa, toicinho branco e fato fresco. Você sabe o que é um Teiú? É calango, desse tamanho, depois de preparado, é mais gostoso que galinha”, receitou. “Meu nome? É Manoel da Paz Argolo dos Santos”, confirmou, desconfiado, mas era conhecido como Mané Bigodinho. Antes, faltavam os dentes da frente, o bigode farto camuflava, também escondia os beiços grossos, depois, com dentes novos, que custaram 600 reais, ganhou “outra moral”. Não tirou mais o bigode porque a mulher já tinha acostumado. O Interfone tocou, atendeu,conferiu a revista na mesa; nunca aprendeu a ler as palavras, somente os números, reconheceu o 702 na capa e foi entregar. Assim seguiu mais um dia na vida de Mané Bigodinho.